Thursday, February 08, 2007

Carminho & Sandra

Actualmente é assim em Portugal:

Carminho senta - se nos bancos almofadados do BMW da mãe. Chove lá fora .Encosta o nariz ao vidro para disfarçar duas enormes lágrimas que lhe rolam pela face. A mãe conduz o carro e aperta-lhe ternamente a mão. Há muito trânsito na Lapa ao fim da tarde. A mãe tem um olhar triste e vago mas aperta com força a mão da filha de 18 anos. Estão juntas. A caminho de Espanha.
(Mais a baixo na cidade)
Sandra senta- se no banco côr-de-laranja do autocarro 22 que sai de Alcântara. Chove lá fora. Encosta o nariz ao vidro para disfarçar duas enormes lágrimas que lhe rolam pela face. A mãe está sentada ao lado dela. Encosta o guarda - chuva aos pés gelados e aperta - lhe ternamente a mão. Há muito trânsito em Alcântara ao fim da tarde. A mãe tem um olhar triste e vago mas aperta com força a mão da filha de 18 anos. Estão juntas. A caminho de casa de Uma Senhora.
O BMW e o autocarro 22 cruzam - se a subir a Avenida Infante Santo.
Carminho despe-se a tremer sem nunca conseguir estancar o choro. Veste uma bata verde. Deita-se numa marquesa. É atendida por uma médica que lhe entoa palavras doces ao ouvido, enquanto lhe afaga o cabelo. Carminho sente - se a adormecer depois de respirar mais fundo o cheiro que a máscara exala. Chora enquanto dorme.
Sandra não se despe e treme muito sem conseguir estancar o choro. Nervosa , brinca com as tranças que a mãe lhe fez de manhã na tentativa de lhe recuperar a infância. A Senhora chega. A mãe entrega um envelope à Senhora. A Senhora abre-o e resmunga qualquer coisa. É altura de beber um liquido verde de sabor muito ácido. O copo está sujo, pensa Sandra. Sente-se doente e sabe que vai adormecer. Chora enquanto dorme.
Carminho acorda do seu sono induzido. Tem a mãe e a médica ao seu lado. Não sente dores no corpo mas as lágrimas não param de lhe correr cara abaixo. Sai da clínica de rosto destapado. Sabe -lhe bem o ar fresco da manhã. É tempo de regressar a casa. Quando a placa da União Europeia surge na estrada a dizer PORTUGAL, Carminho chora convulsivamente.
Sandra não acorda. E não acorda. E não acorda. A mãe geme baixinho desesperada ao seu lado. Pede à Senhora para chamar uma ambulância. A Senhora não deixa, ponha-se daqui para fora com a miúda, há uma cabine lá em baixo, livre-se de dizer a alguém que eu existo. A mãe arrasta a Sandra inanimada escada a baixo. Um vizinho cansado, chama o 112 e a polícia.
Sandra acorda no quarto 122 dias depois. As lágrimas cara abaixo. Não poderás ter mais filhos, Sandra, disse-lhe uma médica, emocionada. Sai do hospital de cara tapada, coberta por um lenço. Não sente o ar fresco da manhã. No bolso junto ao útero magoado, a intimação para se apresentar a um tribunal do seu país: Portugal.
Eu voto sim . Pela Sandra e pela Carminho. Pelas suas mães e avós. Por mim.

Rita Ferro Rodrigues

P.S. – A diferença entre os dois textos, este artigo e a campanha dada ás crianças, é clara na primeira temos relatos ficcionados de um ser que não está provado ser inteligente e temos crianças usadas como veiculo de campanha neste temos a opinião de uma pessoa adulta e não anónima que assina o texto que escreve e utiliza casos que poderiam ser reais.

5 Comments:

Anonymous Anonymous said...

O texto do post anterior (terrível e bem demonstrativo do terrorismo argumentativo adoptado na presente campanha) é muito semelhante a este: ficção propositadamente exagerada, com o propósito de, por intermédio do choque provocado pela crueza do texto, incentivar alguém a votar em determinado sentido.
O que é lamentável é que, não percebendo que os textos são duas faces da mesma moeda, um deles seja criticado e o outro louvado.

6:49 AM  
Blogger David Cameira said...

Estas coisas assim a fazerem chorar as pedras da calcada não serão demagocia ???

Esta campanha está a deteriorar-se : lá porque o sim está " borracho 2 não podem estar sempre a dizer que o não é " faxo "

8:17 AM  
Anonymous Anonymous said...

PARABÉNS EXTRAORDINÁRIO TEXTO, EU VOTO SIM


Abraços Talin

2:12 PM  
Anonymous Anonymous said...

Excelente Texto da familiar de um ex ministro da segurança social que NAO FEZ ABSOLUTAMENTE NADA.
Tem sido as instituições que estao na rectaguarda do Não que tem estado no terreno a apoiar, aconselhar e ajudar as gravidas com problemas.
Essa Dona Rita Ferro Rodrigues certamente é uma carminho. Porque a Sandra é que a menina nao é.

7:26 PM  
Anonymous Anonymous said...

Noto que ambas as meninas choravam. O aborto é sempre mau e deixa marcas. Não é por ser legal e feito num hospital que deixa de ser uma violência abominável, para mãe e filha. Não é por ser "asseadinho" que o aborto se torna tolerável ou deixa de constituir uma profunda violência para a mãe e de deixar nela marcas para toda a vida.

Afinal este referendo é sobre a luta de classes. Vamos votar a injustiça desta sociedade capitalista e se queremos ou não seguir ideiais marxistas...

Já agora quem terá escrito este texto: a menina que viajava no BMW?

4:51 AM  

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